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Flutuações quânticas ajudam a resolver mistério de 10 anos

LHC: Jorge Noronha, professor no Instituto de Física da Universidade de São Paulo, participou do estudo

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Trata-se do padrão de distribuição dos jatos produzidos nas colisões de núcleos pesados no interior dos dois maiores colisores de partículas da atualidade, o Large Hadron Collider (LHC), na Europa, e o Relativistic Heavy Ion Collider (RHIC), nos Estados Unidos.

Artigo descrevendo o resultado acaba de ser publicado na Physical Review Letters: “Event-by-Event Hydrodynamics+Jet Energy Loss: A Solution to the RAA⊗v2 Puzzle” .

Jorge Noronha, professor no Instituto de Física da Universidade de São Paulo, participou do estudo, no âmbito de sua pesquisa “Relativisitic heavy-ion collision dynamics – macroscopic approaches derived from microscopic physics”, apoiada pela FAPESP.

“Descobrimos que as flutuações de origem quântica nas condições iniciais líquido são o ingrediente necessário para explicar o padrão elíptico exibido pela distribuição angular das partículas geradas nas colisões”, disse Noronha à Agência FAPESP.

O líquido mencionado pelo pesquisador é o plasma de quarks e glúons, que, segundo o modelo teórico padrão, teria preenchido o universo durante um diminuto intervalo de tempo após o Big Bang.

Esse meio tem sido recriado, nos dois grandes colisores da atualidade, pelos choques ultrarrelativísticos de núcleos atômicos – isto é, em velocidades próximas à da luz.

A temperatura gerada nessas colisões é tão alta que os quarks e os glúons que estavam confinados no interior dos prótons e dos nêutrons dos núcleos atômicos se desprendem e, durante um exíguo intervalo de tempo, passam a se mover livremente.

Trata-se de um meio muito pequeno, cuja extensão é pouco maior do que o diâmetro do próton. Vale lembrar que o diâmetro do próton é da ordem de grandeza de 10-15 metro.

Esse meio comporta-se como um fluido quase perfeito, que praticamente não oferece resistência ao deslocamento das partículas que o compõem.

“Existem duas ‘assinaturas experimentais’ especialmente importantes a respeito do plasma de quarks e glúons. A primeira é o chamado ‘fluxo elíptico de hádrons’. Isso diz respeito à distribuição angular das partículas geradas a partir das colisões. Depois que o sistema é formado, e que os quarks e glúons voltam a se aglutinar em hádrons [prótons, nêutrons, mésons etc.], os detectores registram os ângulos segundo os quais essas partículas reconfiguradas chegam a eles. E percebe-se que há ângulos preferenciais, cujo conjunto define vários padrões, sendo o padrão elíptico predominante”, informou o pesquisador.

“A segunda assinatura é chamada de ‘atenuação de jatos’. Quando um jato, constituído por um quark ou um glúon em velocidade próxima à da luz, transita no interior do plasma, ele é freado pelo meio e perde energia. Por mais de 10 anos, os especialistas na área tentaram entender como essa perda de energia levava à distribuição angular observada. Mas não obtiveram sucesso. Foi isso que conseguimos fazer agora, combinando a física de jatos com a hidrodinâmica para descrever a situação real de um jato deslocando-se no interior de um meio que, ele mesmo, se expande quase à velocidade da luz”, acrescentou.

Padrões de distribuição das partículas

O padrão elíptico não é o único possível. De fato, existem vários padrões de distribuição angular das partículas: elíptico, triangular, quadrangular, etc.

O que se faz é decompor as distribuições possíveis em um tipo específico de sequência matemática, conhecida como série de Fourier. Isso permite saber quantas partículas obedecem a cada padrão. E o padrão elíptico é o predominante.

A questão era explicar por quê. Foi exatamente isso que a introdução das flutuações quânticas no modelo permitiu fazer.

“Os núcleos atômicos que são levados a colidir constituem-se de prótons e nêutrons. Mas os prótons e nêutrons não se encontram imóveis no interior de cada núcleo. Eles se movem dentro de um pequeno volume. Portanto, a distribuição de energia no interior do núcleo, que fornece as condições iniciais para o problema, não é uniforme. Ela flutua o tempo todo. E isso dá uma ideia do que chamamos de flutuações quânticas”, explicou Noronha.

Convém destacar aqui um dos pilares da física quântica, que é o Princípio da Incerteza, de Heisenberg. Segundo esse princípio, não é possível determinar simultaneamente de maneira exata a posição e a velocidade de cada partícula.

Quando se determina a posição, a velocidade torna-se altamente incerta. E, quando se determina a velocidade, é a posição que se torna incerta. O conceito de flutuação quântica está intimamente associado ao Princípio da Incerteza.

Ademais, dentro dos próprios prótons ou nêutrons, os quarks e os glúons estão igualmente em movimento. E não apenas isso. Existe também um processo incessante de produção e aniquilamento de pares de partículas e antipartículas.

Grosso modo, segundo o modelo padrão, o próton é formado por três quarks. Mas, para usar uma analogia, isso é apenas a fotografia estática de algo extremamente dinâmico.

Uma imagem mais apropriada seria comparar cada próton a um minúsculo e agitado oceano de energia, no qual quarks e antiquarks são produzidos e destruídos o tempo todo.

“Na verdade, o próton é uma realidade muito complicada, que só agora estamos começando a compreender. Há vários modelos diferentes que buscam descrevê-lo”, comentou o pesquisador.

Resumindo: a situação é a de um sistema, o plasma de quarks e glúons, com densidade de energia muito alta, semelhante à do universo primordial.

Um sistema em flutuação, no qual transitam jatos de partículas em velocidades próximas à da luz. Estes perdem energia ao transitar.

A detecção experimental das partículas resultantes mostra que a sua distribuição angular segue preferencialmente um padrão elíptico.

“Introduzindo as flutuações quânticas nas condições iniciais usadas nas simulações computacionais, foi possível chegar, pela primeira vez, a um resultado compatível com o padrão experimentalmente observado”, enfatizou Noronha.

“Esse cálculo envolveu várias camadas de teoria. Foi preciso considerar a densidade inicial de energia do sistema; considerar também como, a partir de cada condição inicial, o sistema evolui, expandindo-se em velocidades próximas à da luz; e considerar ainda como cada jato de quark ou glúon perde energia dentro desse meio. Devido às flutuações, é necessário fazer a simulação evento por evento, considerando várias densidades iniciais de energia. Isso significa rodar centenas de simulações. E, depois de tudo isso, calcular a distribuição estatística das várias simulações para chegar a algo próximo do comportamento real”, detalhou o pesquisador.

 

As simulações foram rodadas em computadores da Universidade de Columbia, da Universidade de Frankfurt e da Universidade de São Paulo (USP). E o resultado obtido mostrou-se consistente com os dados experimentais.

 

“Além do cálculo do fluxo elíptico, fizemos também, pela primeira vez, o cálculo do fluxo triangular de partículas com energia alta. Esse fluxo só é diferente de zero quando se incorporam flutuações quânticas”, finalizou Noronha.

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte:AGÊNCIA FAPESP

Reditado para:Tecnologia Stop 2016

Fotografias:Getty Images

Tópicos:Ciência, Energia, Energia nuclear, Infraestrutura, Física

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