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Guiné-Bissau: remodelação governamental "vai trazer mais dissidentes"

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Esta terça-feira, o Presidente Umaro Sissoco Embaló assinou e publicou uma série de decretos, procendendo a nomeações que remodelaram por completo o Governo. Em entrevista à RFI, o jurista guineense Fodé Mané alega que o país assiste a uma "acumulação de ilegalidades", a última sendo a nomeação para cargos governativos de personalidades próximas e

fieis ao chefe de Estado.

Esta lista de nomeações acontece em plena crise interna no partido do Madem G-15, uma semana depois das duas reuniões das alas divergentes, em que ficou claro quem se posiciona de forma fiel ao Presidente Sissoco ou ao até então coordenador do partido, Braima Camará.

Esta remodelação do governo vai, ainda segundo Fodé Mané, ter "efeitos perversos" e resultar em maior dissidência nos partidos políticos. 

Esta terça-feira foram nomeadas figuras políticas fieis ao Presidente para cargos no governo, através de decretos presidenciais. São legais estas nomeações?

Havia algumas vagas por preencher no governo há dois meses. Primeiro, desde que alguns ministros afectos ao partido de Nuno Nabiam,  APU-PDGB, aceitaram acatar as orientações do partido para se retirar do governo. Então houve três ministros e um secretário de Estado que tinham pedido demissão. E o Presidente nesta sua atitude de confrontação aceitou e não foram nomeadas pessoas para os substituir. Depois houve o PRS, o Ministro da Saúde que também pediu demissão e mais tarde, quando Fidelis Forbs, do Madem G-15, e um dos vice-coordenadores, mostrou a relação com o Braima Camará, foi exonerado. Então havia vagas para preencher. 

 

Houve também substituição de ministros, como é o caso de Nicolau dos Santos, exonerado do governo e substituído por Dionísio Cabi, antigo presidente do Tribunal de Contas. 

Porque ele (Nicolau Santos) não tinha declarado claramente estar ao lado da facção do PRS que apoia Sissoco. Então certamente ia ser retirado. Não há novidades.

Dá impressão de que o Presidente está a promover as alas do Madem G15 e do PRS que lhe são fieis.

Sim, só que, pelo contrário, vai ter efeitos perversos. Porquê? Primeiro, porque algumas pessoas que estavam na ala dos inconformados, tanto do PRS como do Madem, e que estavam à espera de serem chamados para preencher aqueles lugares, não foram. Porque não há lugar para agradar e acomodar todos os interesses. Então essas pessoas vão ficar de lado e o que acontece? Vão-se juntar mais uma vez no exército dos opositores ao regime. 

Há uma carta que esteve a circular ontem de um dos primeiros a pedir demissão, Fernando Victor Mandinga. Victor Mandinga fez uma carta em explica que, quando se está no governo, é necessário dizer "sim senhor Presidente" a tudo. E que mesmo nos Conselhos de ministros, não há debate. Não há nada. Se não disseres "sim, senhor Presidente", corres o risco de sair.

Portanto, os que andavam a questionar, a tentar opinar, foram afastados. O Fernando Mandinga revelou precisamente qual era o ambiente naquela altura e como é hoje. Por isso quem tem um mínimo de sensibilidade sobre questões de  legalidade e democracia não pode acompanhar este regime político.

Portanto, estas remodelações podem, no limite, ser justificadas do ponto de vista jurídico, mas considera que estamos perante mais um golpe de força do presidente, que procura rodear-se dos seus mais fieis?

É exactamente o que se está a passar. Mas não tem nenhum valor jurídico, não tem nenhum enquadramento, é apenas uma demonstração de força para afastar quem está no outro lado e quem ainda não definiu a sua posição. 

Mesmo aqueles que foram militantes do PAIGC e que fizeram parte deste governo, à revelia das orientações do seu partido, foram obrigados a tomar uma posição clara. Eles deram conferência de imprensa, atacaram a direcção do partido e agora está-se a ventilar de que também estão a pensar criar um movimento de inconformados dentro do PAIGC, que já existe em todos os partidos com assento parlamentar, excepto o PTG (Partido dos Trabalhadores guineenses) de Botche Candé, mas existe no PRS, existe no APU, existe no Madem G15. 

Poderá o chefe de Estado, Umaro Sissoco Embaló, ser designado presidente honorário do Madem-G15, na sequência da proposta feita pela ala do partido do Madem G-15 que lhe é fiel? 

Esta proposta não tem nenhum valor jurídico e muito menos em termos políticos. Simplesmente cabe na deriva de ilegalidade que se está a verificar. O que tem acontecido são sinais claros de que a legalidade dos procedimentos não são respeitados. A própria convocação daquele congresso extraordinário [convocado pela ala fiel a Sissoco, no mesmo dia em que a ala de Braima Camará organizou um conselho nacional, a 17 de Agosto] desobedece a todos os procedimentos estatutários. Sabe-se também de vários actos de ilegalidade interna ao partido. 

Porque é claro que a luta que existe não é para o cumprimento dos estatutos, é para manter fiel à actual situação ou contestar. Então, eleger o Sissoco como presidente honorário é uma forma de afrontar aquilo que é feito pela outra ala, que tinha escolhido o ex-presidente José Mário Vaz como seu presidente honorário.

Qual pensa que pode ser  a decisão do Supremo Tribunal sobre a nomeação de Satú Camará para coordenadora do partido do Madem-G15, aprovada pela ala fiel a Sissoco durante o congresso extraordinário? 

O Supremo Tribunal tem estado a proceder nesta onda de violação da legalidade. O Supremo Tribunal extravagou as suas competências. Não se limitou apenas a anotar decisões, mas a declarar como legítima determinada ala de determinado partido. Quando o Madem apresentou uma acção de providência cautelar para impedir a realização do tal congresso extraordinário, o que fez o Supremo? Fez uma nota a impedir o juíz de receber o processo.

É uma ilegalidade. Por isso é que dizemos que, hoje, há apenas uma pessoa a funcionar com todas as instituições. É Umaro Sissoco que decide em nome do Tribunal, em nome da Assembleia, em nome do governo, em nome de tudo. Os outros são apenas ajudantes.

Tudo o que a sociedade civil tem vindo a pedir, incluindo a realização de eleições presidenciais, vai ser agora mais difícil de exigir?

Vai ser mais difícil, porque cada vez há acumulação de ilegalidades, há limitações que a Constituição impõe ao Presidente da República, e nós sabemos que a tendência é de continuar a violar essas limitações. Mas isso vai agitar cada vez mais tanto a sociedade civil como algum sector político.

O que aconteceu com a coordenação de Madem é que ficaram fartos de defender ilegalidades. Há quem bateu com a mão na mesa. Dentro dos próprios partidos políticos acaba por haver cada vez mais dissidência. Só para repararmos: Nuno Nabiam, Fernando Dias, Braima Camará foram fortes apoiantes de Umaro Sissoco. Foram as pessoas que o levaram ao poder. Mas hoje todos têm uma posição diferente. 

E com esta remodelação governamental vamos ter outra vez alguns dissidentes, porque o que alimenta os guineenses é a nomeação para lugares públicos, a nomeação é como uma premiação. Ontem, não só houve nomeação de membros do governo, como houve exoneração de directores. O director do Fundo Rodoviário, a governadora da região de Biombo... Exonerados. Nomeou-se o filho de Satú Camará, ela própria nomeada coordenadora do Madem, como director. São formas de compensação e isso está a acontecer noutras instituições, desde o Governo Regional até às direcções-gerais, com o expurgar dos indesejados. Mas também cada vez mais pessoas, próximas de Sissoco, estão a mostrar que já estão cansadas. Vê-se no caso de Óscar Barbosa.

Como explica a saída voluntária de Óscar Barbosa do governo, ele que foi conselheiro e porta-voz de Umaro Sissoco Embaló? 

Entre todas as demissões, esta foi a que mais surpreendeu. Óscar Barbosa não é uma pessoa de princípios. Esta situação em que Sissoco está a ser isolado pelos próprios companheiros de partido e que Óscar Barbosa diz estar do lado de Braima Camará é uma supresa. Isto dá para duvidar sobre se não se trata de uma armadilha... Também podemos acreditar na sua boa fé. Mas toda a gente em Bissau comenta a situação de Óscar. São sinais para vermos que o único pilar que sustenta Umaro Sissoco é a força. Não é nenhuma legalidade.

 

 


Fonte:da Redação e da rfi
Reeditado para:Noticias do Stop 2024
Outras fontes • AFP, AP, TASS, EBS
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