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Segunda, dez.

Adiamento de distritais: CIP recomenda que Frelimo realize consulta pública

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pelo povo.

O porta voz-da bancada da Frelimo, Feliz Sílvia, refere que a proposta tem em conta o relatório da Comissão de Reflexão sobre a Viabilidade do Processo, que concluiu que não há condições para a realização das eleições Distritais em 2024. A proposta foi contestada pelos partidos da oposição que acusam a Comissão de “estar ao serviço da Frelimo” e que esta decisão “abre caminho a um terceiro mandato do Presidente Filipe Nyusi”.

O investigador do Centro de Integridade Pública de Moçambique, Ivan Maússe, refere que se a Frelimo quiser adiar as eleições distritais 2024, previstas na Constituição, deve criar condições para a realização de uma consulta pública, permitindo que os grandes assuntos da nação possam ser escrutinados pelo povo.

RFI: Que leitura se pode fazer desta proposta de revisão constitucional da Frelimo para adiar as primeiras eleições distritais em 2024?

Ivan Maússe, investigador do Centro de Integridade Pública: A primeira vez que foi discutida publicamente a matéria sobre a possibilidade de se adiarem as eleições distritais de 2024 foi em Maio de 2022. Na altura, Filipe Nyusi- presidente da Frelimo e chefe de Estado do país- convidou os moçambicanos, no encerramento da reunião do Comité Central da Frelimo, a reflectir sobre a viabilidade destas eleições.


Esse discurso acabou por ser repetido, em Agosto de 2022, durante a 3ª Conferência Nacional Sobre Descentralização, em Nampula, e em Dezembro do mesmo ano, aquando da leitura do informe sobre o estado da nação.

Já era uma decisão expectável?

Exactamente. Nós apercebemo-nos que, em 2023, esse discurso voltou a ser objecto de referência por parte de outros membros da Frelimo.

A Frelimo justifica a proposta com base no relatório da Comissão de Reflexão sobre a Viabilidade do Processo que concluiu que: “Moçambique não dispõe de recursos suficientes para garantir a expansão do modelo de descentralização para os distritos”. Moçambique não tem recursos suficientes para garantir a descentralização?

O discurso da Comissão é um pouco perigoso e precipitado. A Comissão teve um período muito curto para pensar ou reflectir sobre estas eleições. Inicialmente, foram apenas 15 dias, embora depois tenham sido prorrogados por mais 30 dias. No entanto, passados os 15 dias, a ministra da Justiça, Helena Quida, fez a leitura do parecer da Comissão. Na nossa opinião, é um parecer prematuro e precipitado, uma vez que a Comissão não teve tempo para apresentar um parecer técnico. As pessoas que foram ouvidas, neste processo de auscultação, não estão em número representativo.

O que deve ser tido em conta não é a viabilidade das eleições. Devemos perceber se o modelo, para a realização das eleições, se deve ou não inspirar no modelo escolhido nas eleições para as Assembleias Provinciais, em 2019.

O estabelecimento da descentralização obedece ao princípio do gradualismo. Ou seja, não precisamos de descentralizar todos os 154 distritos que o país tem actualmente. Pode-se começar por descentralizar alguns distritos que tenham condições patrimoniais, financeiras, capazes de gerar receitas, para poderem funcionar.

É essa lógica que funciona para os municípios. Os municípios, os que estão descentralizados, obedecem ao princípio do gradualismo. Em 1999, nós começámos com 33 municípios e, fomos crescendo, hoje temos 65 municípios. Então, porque razão não podemos pensar no mesmo modelo em relação aos distritos? Podemos, muito bem, descentralizar alguns distritos e ao longo do tempo- em função da demanda social, do desenvolvimento económico do país- obter distritos descentralizados de forma crescente.

A Comissão acrescenta, ainda, que as primeiras eleições distritais, nos termos previstos na Constituição da República, devem ter lugar “logo que sejam criadas as condições para a sua realização”. Que condições são essas?

Isso é muito subjectivo. Enquanto não tivermos uma lei, sobretudo, referente à realização das eleições distritais- uma lei ordinária e não uma norma constitucional- nunca vamos saber quais são essas condições.

Se houvesse uma lei, tal como acontece para as Assembleias Provinciais, mostrando quais as condições para a realização do escrutínio, que fala sobre a autonomia administrativa, financeira e patrimonial, quem sabe se dessa forma iríamos saber se as condições estão reunidas.

A oposição moçambicana veio lembrar que as eleições em Moçambique são financiadas pela Comunidade Internacional, rebatendo o argumento de que o país não tem dinheiro para realizar estas eleições…

Seguramente! Diversas organizações da sociedade civil vieram dizer que se tem gastado muito dinheiro na realização de eleições. Nós temos eleições autárquicas este ano e no ano seguinte temos eleições gerais. Porque é que não se juntam as eleições gerais e as autárquicas.

Porque é que isso não acontece?

Isso não acontece, na nossa opinião, porque as eleições autárquicas, que antecedem as gerais, servem como um barómetro para a tendência do voto. Em função disso, o partido no poder faz o TPC (Trabalho de Casa) para o ano seguinte.

A oposição moçambicana, Renamo e MDM, acusa a comissão de estar ligada aos interesses da Frelimo. A ser verdade, a Frelimo tem interesse em adiar esta eleição?

Objectivamente, sim! Porque é a única força política que defende o adiamento das eleições. Sabemos que a oposição, ao nível dos distritos, tem alguma legitimidade. E, claramente, se começarmos a descentralizar o distrito, onde a oposição tem algum poder político, pode ser o ponto de partida para a Frelimo perder legitimidade e aceitação ao nível do poder macro.

Portanto, evitar a realização de eleições distritais, acautela a ameaça do poder chegar a níveis mais exteriores.

Graça Machel defendeu que um adiamento das eleições distritais se deve basear num consenso nacional, considerando que a oposição deve encontrar formas de se fazer presente face à “ditadura da maioria” no poder. Que formas são essas?

O país foi sempre construído tendo por base o conflito militar e, o modelo de descentralização que temos agora, conseguido através de consensos, é necessário que as forças políticas, que estiveram a liderar esse processo, precisam de se sentar à mesa das negociações, mais uma vez, para discutirem um modelo aceitável, consensual para Moçambique. Ou seja, aproximando o poder político do cidadão.

Quais é que são as recomendações do Centro de Integridade Pública, relativamente à proposta da Frelimo?

É importante que se tenha alguma cautela quando se faz a revisão da Constituição. Claramente, do ponto de vista temporal e material, é possível a alteração da Constituição. Todavia, temos de ter em conta que a "lei mãe " não pode ser alterada ao bel-prazer das forças políticas de Moçambique . É importante que a Constituição seja duradoura. Quando se concebe uma norma constituicional, temos que perceber que já é um direito adquirido. Por exemplo, a previsão das eleições distritais, nos termos do artigo 311 n° 3 da Constituição, é um dado adquirido para os moçambicanos. É um direito fundamental. A liberdade que os moçambicanos tem de eleger os órgãos distritais.

Agora, se queremos retirar esta norma, é importante que haja uma consulta pública. Infelizmente, em Moçambique não temos o referendo. Talvez, a nossa sugestão é para que as autoridades reflictam na necessidade de se criar uma lei que regule o direito para um referendo. Desta forma, permitiria que os grandes assuntos da nação moçambicana fossem escrutinados pelo próprio povo.

A sociedade moçambicana deve ganhar coragem para reclamar esses direitos?

Seguramente. Mas isso implica que haja literacia legal. Infelizmente, em Moçambique, ainda temos o grande problema do analfabetismo e da iliteracia legal sobre o conhecimento dos direitos dos moçambicanos, relativamente às instituições a que podem recorrer para a reposição desses direitos.

 

 

 

 

Fonte:da Redação e da RFI
Reeditado para:Noticias do Stop 2023
Outras fontes • AFP, AP, TASS, EBS
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