O professor de ciências havia explicado naquela tarde como uma lagarta virava uma borboleta. Disposta a testar a ideia, a menina colocou um casulo dentro de um vidro de maionese, fez uns furinhos na tampa e esperou. Nasceu uma borboleta, como dissera o professor. Mas ela tinha as asas amassadas e não conseguia voar.
Arrasada, a menina cobrou explicações do professor. "Eu não sei o que aconteceu", ele disse. "Mas talvez tenha faltado água", arriscou.
Ela arrumou outro casulo no quintal e o depositou com cuidado no vidro de maionese. Colocou um pouco de água lá dentro e, ai sim, fechou com a tampa furada.
"Deu certo, eu consegui fazer uma borboleta", conta Duília de Mello. "Eu não duvidei da palavra dele, nem aceitei: eu fui lá, testei e consegui provar. Acho que foi a primeira vez que a minha curiosidade científica foi despertada", conta ela que, hoje, aos 50 anos, é astrofísica da Nasa, a agência espacial americana.
Nada mal para a menina de origem humilde, nascida em Jundiaí, no interior de São Paulo, e criada no subúrbio do Rio por um pai alcoólatra e uma mãe zelosa.
Agora, para que cada vez mais crianças consigam superar as adversidades e se interessar por carreiras científicas, Duilia está criando a ONG Mulher das Estrelas (http://mulherdasestrelas.com), reunindo uma rede de mentores de diferentes especialidades, como física, matemática e robótica.
A astrônoma já conta com a ajuda de 20 profissionais. A ideia é estimular a criação de clubes de ciências e as competições científicas entre as escolas, com a curadoria à distância desses especialistas, para fazer com que crianças de origem pobre por todo o Brasil possam ganhar asas e mirar estrelas.
"Quero poder ajudar às pessoas que não tiveram tanta sorte quanto eu, ou que não tiveram uma mãe tão empenhada como a minha", diz ela, em entrevista por telefone, de Washington.
Informalmente, ela afirma já fazer essa espécie de mentoria à distância. "Muitos desses estudantes me acham na internet, me mandam mensagens. Eu respondo a todas elas, explico como é a profissão."
Perdidos no Espaço
Já na pré-adolescência Duília foi fisgada pelo fascínio da ficção científica. Era fã de Jornada nas Estrelas e Perdidos no Espaço, clássicos da televisão dos anos 60.
"Sempre fui apaixonada pelo Universo e, desde pequena, queria entender como ele funcionava tão bem sendo tão complexo", contou.
"No fim dos anos 1970 eu vivia vidrada nas descobertas das naves espaciais da Nasa, Pioneer 10 e 11, que estavam visitando Júpiter e Saturno. Naquela época não tínhamos internet, e o acesso à informação era bem restrito, principalmente para quem era de classe média baixa, como nós. Lembro de uma revista Manchete com uma grande reportagem sobre Júpiter. Fiquei impressionadíssima."
Enquanto o pai de Duília lutava contra o alcoolismo e tentava ganhar algum dinheiro para sustentar a família - primeiro como caminhoneiro, depois com um negócio de locação de mesas de totó (pebolim) -, a mãe dedicou a vida a fazer com que os quatro filhos estudassem. E conseguiu.
"Mas quando eu dizia que queria fazer astronomia, todo mundo falava que eu era