Anh Nguyen: "A Ucrânia vai precisar de migrantes estrangeiros para a reconstrução”

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Hoje 1 ano depois, diz-nos que os que regressaram não são suficientes para reconstruir o país.

Correspondência de José Pedro Frazão, 12/03/2023

Pensou-se na possibilidade de uma segunda vaga. Isso não aconteceu. Passámos o Inverno. Como avalia a situação em matéria de migrações?

Temos vindo a fazer estudos muito regulares que nos permite ter uma melhor compreensão das intenções e necessidades destas pessoas. Concluímos pelos estudos que os ucranianos são muito mais resilientes do que pensávamos. Mesmo ao longo do Inverno, esperávamos um ponto muito crítico antes de haver qualquer movimento de massas. Vimos isso mas penso que tivemos também sorte durante o Inverno, que foi menos frio do que esperávamos e com ataques à infra-estruturas menos intensos do que vinha acontecendo no ano de 2022.


O que é que vai acontecer durante a Primavera?

Estamos a tentar antecipar o cenário com os estudos que temos. Acabámos de lançar um relatório sobre o regresso de pessoas, que aborda as suas intenções nesse sentido. A 23 de Janeiro, tínhamos 5.5 milhões de regressados e 80% disseram querer ficar nas suas casas. É um número muito elevado. Temos que começar a ver as condições em que eles estão, para garantir que têm abrigos adequados, oportunidades de emprego e acessibilidade de serviços.

Estas pessoas têm a expectativa de ter emprego neste contexto de guerra? Que tipo de ajuda pode dar a OIM?

Essa é não apenas a nossa prioridade como também é a do Governo. Faço parte de um grupo de trabalho sectorial que junta diferentes plataformas ligadas à recuperação geral. Nesse grupo que trata dos regressos, identificamos que o emprego é a maior preocupação da população. Temos estado a trabalhar com o banco de desenvolvimento alemão e outros doadores para vermos como podemos aumentar o número de empregos. Estamos mesmo a falar de criação de emprego. Ajudamos a restabelecer lojas que foram destruídas e negócios deslocalizados.

Ajudámos por exemplo uma empresa que produzia materiais para telhados. Começámos por tratar da maquinaria que foi destruída. Mas reparámos que era também um ponto de fornecimento de materiais de que precisamos para os nossos trabalhos de reconstrução. Não se trata apenas de criação de emprego, mas de olhar de forma mais alargada para as cadeias de fornecimentos e de valor de que precisamos para começar os nossos esforços de recuperação. Começámos pela construção e pela agricultura, que são áreas chave que nos conduzem aos estudos relacionados com o mercado laboral que estamos a fazer com a Organização Internacional do Trabalho. Vão permitir perceber quais os sectores que têm lacunas que têm que ser preenchidas e isso permitirá desenhar uma resposta mais refinada no processo de recuperação.

Que sectores são esses?

São os sectores da agricultura e construção. Na agricultura não se trata apenas dos cereais, mas também de processamento de carnes.

A Ucrânia vai precisar de migrantes?

Sim. Vamos saber mais num estudo que vamos fazer sobre perspectivas económicas. Tendo por base as projecções do Governo ucraniano, em termos de recuperação do seu PIB e da estimativa de regressos, penso que haverá falta de mão-de-obra. Tivemos um debate ainda antes da guerra, quando ainda não tínhamos 5.5 milhões de deslocados e onde já se reconhecia falta de mão-de-obra. É algo que tem de ser abordado na perspectiva de políticas, de legislação e muito na prática. Tem que se avaliar como se gerem os potenciais fluxos de migrantes económicos que venham a ser necessários para a reconstrução e para a recuperação.

Se a guerra terminasse amanhã a reconstrução seria um trabalho para 3 a 5 anos já com estes trabalhadores?

Podemos esperar esse espaço de tempo em termos de reconstrução. Quanto aos migrantes laborais teremos que esperar para ver. Quando vêm grandes empresas de construção trazem muitas vezes os seus trabalhadores e eles são também migrantes. Antecipo que esta seja uma das componentes da recuperação.

Em toda a Europa há migrantes ucranianos a trabalhar para o seu país, por exemplo, no sector das tecnologias e da comunicação. Essa força de trabalho que está fora da Ucrânia é necessária no país?

É difícil de responder porque com a pandemia observámos uma modalidade híbrida a funcionar. É importante notar a forma como a Ucrânia manteve as ligações com os seus migrantes no estrangeiro. Sei que existe um esforço concertado e planos para a criação de “jardins tecnológicos“ para atrair o sector de tecnologia da informação incluindo os que possam regressar. Temos que ver como será essa ligação em termos sociais. A questão da habitação e dos serviços disponíveis será também decisiva.

Muitas pessoas deslocaram-se para a Ucrânia Ocidental optando por não sair do país. Como avalia a pressão sobre essa zona?

A pressão tem vindo a diminuir face à um ano. Vemos cada vez mais pessoas a regressar para regiões do Leste e isso alivia a pressão que vimos. Se olhar para cidades como Lviv ou Uzourhorad, a densidade populacional está a cair e a regressar quase ao normal. Os quartos de hotel em Lviv já são quase acessíveis…

Que trabalho está a fazer a OIM na linha da frente do combate?

É uma parte muito importante do nosso trabalho, na perspectiva humanitária. Fico feliz por observar o sentido de colaboração que tem existido internamente no sistema da ONU. Fazemos colunas conjuntas de distribuição de ajuda. Podem ter o símbolo da OIM mas são gente do programa alimentar mundial, o Alto Comissariado para os refugiados e no dia seguinte pode ser ao contrário. É por isto que a ONU tem um sistema de agências e é no terreno que ele trabalha melhor. A necessidade aguça o engenho, mas também nos ajuda a sermos muito mais colaborativos para podermos servir a população da Ucrânia. Têm sido um processo muito bom em termos de logística necessária para entregar ajuda às aldeias.

A Organização Internacional das Migrações está também a reparar telhados e janelas?

Sim. Temos mais de 700 equipas móveis pelo país a tentar perceber onde estão os estragos e de forma a podermos fazer pequenas reparações. No Inverno foi uma acção muito importante para conservar o calor o mais possível, mas casas. E vamos continuar a fazê-lo, em especial nas zonas mais afectadas pelos bombardeamentos.

Sei que têm um papel muito importante em termos de energia. Como vimos nos últimos dias, o sistema energético pode ir abaixo com os ataques. Vão continuar esse esforço?

Quando o Inverno termina, começamos a planear o próximo. Quero que estejamos prontos para apoiar o processo e ainda mais bem preparados para o próximo Inverno. O nosso trabalho começa agora. Temos que ver onde devermos colocar os geradores onde são mais necessários, como arranjar os combustíveis de que precisamos, como mobilizar os fundos necessários para apoiar os mais vulneráveis.

Já relocalizaram todo o vosso staff? Já normalizaram a vossa operação?

Estamos nos 90% face à normalidade. Não posso estar mais orgulhoso e honrado pela resiliência dos nossos trabalhadores. Tenho sempre medo que eles caiam num burnout. Há este desejo de fazer parte num processo que faz a diferença para que as pessoas continuem em frente. Temos cerca de 750 trabalhadores espalhados por todo o país. Montámos estruturas de forma a garantir que elas estão seguras e que lhes permita fazer o trabalho que fazem.

 

 

Fonte:da Redação e da RFI
Reeditado para:Noticias do Stop 2023
Outras fontes • AFP, AP, TASS, EBS
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