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Pedro Cabrita Reis expõe obra monumental no jardim do Louvre

Arte & Cultura
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O Jardim das Tulherias, em Paris, acolhe, até 7 de Junho, a obra “As Três Graças” do artista português Pedro Cabrita Reis, concebida no âmbito da Temporada Cruzada Portugal-França e a convite do Museu do Louvre. “As Três Graças” são três esculturas monumentais que “brotam de um passado com mais de dez mil anos” e que também “brotam da terra portuguesa porque são feitas em cortiça”.

Impõem-se primeiro como formas brancas num espaço dominado pelos verdes, no Jardim das Tulherias. Vem depois a escala e a impressão que elas são mais altas que o Museu do Louvre lá atrás. Chamam-se “As Três Graças”, têm quatro metros e meio cada uma, pesam cerca de 500 quilos e nasceram das mãos do artista português Pedro Cabrita Reis, a convite do Louvre e no âmbito da Temporada Cruzada Portugal-França. Contrastando com as interpretações clássicas do tema, Pedro Cabrita Reis fez musas de cortiça e reincidiu no ferro. Um jogo entre passado e presente, que vai ser oficialmente inaugurado a 14 de Fevereiro e vai estar exposto até 7 de Junho.

No dia da instalação, num café com vista para o Jardim das Tulherias, Pedro Cabrita Reis esteve também à conversa com a RFI.

RFI: Porque é que escolheu o tema das “Três Graças”? E porquê em cortiça e aço quando as esculturas clássicas deste tema são, em geral, de mármore e quando estamos junto a um dos museus mais académicos do mundo que possui justamente várias versões clássicas das “Três Graças”?

Pedro Cabrita Reis: “As Três Graças”, como outras obras da Antiguidade, interessam-me e um artista, em qualquer época, olha sempre para as obras de outros artistas, sejam seus contemporâneos, sejam do passado, por muito distante que ele possa ser. “As Três Graças” sempre me interessaram. É um objecto quase icónico. É um tema que atravessa a História da Arte há milhares de anos, vem desde a Antiguidade Clássica até ao presente. Interessa-me isso por essa circunstância particular e pelo facto de, como outros temas da Arte Clássica - como “A Liberdade Guiando o Povo” de Delacroix, por exemplo - interessa-me olhar para os períodos da História da Arte que me precederam. “As Três Graças” fazem parte disso.

No Louvre há várias versões de “As Três Graças”…

Há várias versões das “Três Graças” seja em escultura, seja em pintura. De alguma forma, interessa-me também estabelecer diálogos, pontes entre as colecções dos museus e o meu próprio trabalho. Neste caso impunha-se. Aqui é uma conjugação feita entre o meu interesse pelo estudo das obras de arte clássicas e a relação com o museu que tem no seu património algumas manifestações desse mesmo tema.

“As Três Graças” são, por aceitação académica talvez, a encarnação do belo, da perfeição, do ideal. O Pedro trocou o habitual mármore clássico pela cortiça pintada de branco, do rugoso tirou o liso, do rústico tirou o delicado… Foi em busca do belo, do seu ideal ou do pomo da discórdia das “Três Graças”?

Há várias questões incluídas nessa sua pergunta. “As Três Graças” há quem diga que são, de facto, a representação da beleza feminina. Pode ser que sim mas, nesse caso, onde é que ficaria, por exemplo, “A Primavera” de Botticelli? Onde é que ficariam as pinturas de Rubens? É controversa essa questão. Não me rejo nem sigo critérios normativos dessa natureza. Na Guernica, a mulher que grita da janela horrorizada com o massacre que está a ver de sua casa, também é o ideal de beleza feminina do Picasso. Bom, a noção do Belo… Sabe que a beleza é uma manifestação de harmonia que em grego era “kanon”. A beleza é sempre a manifestação de uma forma de equilíbrio e de harmonia. As obras de arte são elas próprias a materialização dessa busca do cânone, do equilibro, da beleza, da perfeição. A beleza é apenas uma palavra para designar equilíbrio, harmonia…

E os materiais nisso tudo? Estamos habituados a associar o mármore aos materiais ditos nobres, mas não a cortiça…

Em termos da História da Arte, claro, os materiais nobres são o mármore e o bronze, mas esse tipo de linguagem já há muito tempo que…

É anacrónica?

Anacrónica não será, foi posta em causa, discutida. Hoje em dia podemos dizer que o aço corten ou o alumínio ou o vidro também são materiais nobres...

O néon também?

Exactamente, o néon. Ou seja, todos os materiais que os artistas na sua criação trazem para a nomenclatura, para o vocabulário formal da criação artística passam a ser, por isso mesmo, nobres. Eu que, por exemplo, trabalho com materiais encontrados - que às vezes até podem ser no lixo - para mim, uma mesa com uma perna a menos encontrada no lixo e que figura numa escultura minha é um material nobre…

É o que você costuma chamar de “poética das coisas normais”?

Exacto e podemos acrescentar a nobreza que resulta da escolha. Um artista enobrece uma pedra que apanhe no chão e que ponha numa sala de exposições.

No entanto, você sempre contestou qualquer etiqueta ou referência à história da arte dos objectos recuperados, do “ready made”, aos “Dada”, ao “Nouveau Réalisme”, ao “Pop Art”… Os materiais contêm uma emoção, uma verdade, uma política, uma ética?

Acima de tudo, sobre os materiais que me interessam, não há materiais que não tenham sido tocados pela mão humana. Qualquer mesa foi usada como mesa para alguém comer em cima dela ou fazer outras coisas que se fazem em cima das mesas. Qualquer criança deve ter feito uma cabana, um palácio, uma gruta por baixo de uma mesa. Os objectos que eu incluo no meu trabalho e que descubro e recupero na vida do dia-a-dia são abandonados por uns e tomados por outros. Neste caso são tomados por mim. Esses objectos são sacralizados porque foram usados por pessoas que lhes deram uma função e que a um momento qualquer da vida os abandonaram. Entro eu e recupero-os e continuo…

A dar-lhes vida?

A dar-lhes vida.

A primeira coisa que salta à vista quando vemos as suas “Três Graças”, como uma evidência ou um espanto, é a luz que reflectem estas esculturas monumentais. Uma luz escultural que revela e acaba de construir os volumes e a sensualidade das formas, ate porque estamos a falar das “Três Graças”. Quase como aquelas árvores ou oliveiras em que se pintam os troncos de branco… Estas “Três Graças” brotaram das serras portuguesas?

Bom, estas “Três Graças” brotam de um passado com mais de dez mil anos que remonta até ao período anterior à Antiguidade Clássica, mas brotam da terra portuguesa porque são feitas em cortiça. E, no facto de serem feitas em cortiça - que é um material que é identificado com Portugal, de alguma maneira, embora haja cortiça na Grécia, na Turquia, na Itália, em Espanha, etc, - mas na verdade por quaisquer razões que foram acumulando ao longo do tempo, a cortiça acaba por ser um material de Portugal.

Foi, por isso, que eu também resolvi fazer as esculturas em cortiça porque as esculturas foram feitas a convite do Louvre integradas numa operação ampla de diplomacia cultural entre os dois países, Portugal e França, que é a chamada Temporada Portugal-França. Nesse quadro, parecia-me absolutamente natural ir buscar à cortiça aquilo que eu precisava para fazer as esculturas e trazer aqui [Paris] esse material tão nosso do qual me servi pela primeira vez. É preciso dizê-lo, nunca tinha trabalhado em cortiça antes, mas usei-a pela primeira vez para produzir estas esculturas. Era a decisão que se impunha, podia ter feito as esculturas de outra coisa qualquer, podia ter feito em aço, podia ter feito em madeira, podia ter feito em pedra. Nada disso.

Mas o ferro continua a ser a base, não é?

O ferro é a base porque o ferro representa, de alguma maneira, um passado meu. Isto é, eu fiz muitas esculturas em ferro, em aço corten, usando vigas industriais, as mesmas vigas com que se fazem prédios e pareceu-me interessante trazer como base para uma escultura - que é feita num material novo e que ela própria também é nova no sentido em que faz uma proposta antropomórfica - pareceu-me bem fazer esta ligação entre o passado e o presente, pondo as bases das esculturas, que é o passado, como a base do presente. Ou seja, o passado sustenta, na verdade, o presente. O seu dia de amanhã será sustentado pelo que você fez hoje e assim sucessivamente até que não haja mais dias de amanhã. Em arte isso é a mesma coisa. Mesmo as rupturas em arte, que são aparentemente radicais – nunca há, de facto, rupturas radicais – mas, de qualquer maneira, as rupturas, mesmo elas, são processos que sustentam a continuação da prática da criação artística. Portanto, muito rapidamente as rupturas se tornam o passado de qualquer coisa de novo que vai aparecer a seguir.

Nos locais onde instala obra, você consegue habitar o espaço e abrir uma nova percepção deste, contrastando com o que existe… Aqui, estamos junto a um dos museus mais clássicos do mundo, com a instalação de uma obra cujo título remete logo para a iconografia clássica, envolto de trânsito numa das ruas mais movimentadas de Paris. Como é que procedeu, o espaço entrou realmente em conta?

Bom, a ideia de fazer uma escultura no jardim foi, desde o princípio, bastante estimulante para mim. Ainda por cima no Jardim das Tulherias, que todos os parisienses conhecerão, que é um jardim que está povoado de esculturas de diversos autores de períodos históricos diferentes. Esta minha é de arte contemporânea. Há uma outra peça de arte contemporânea do Penone que é uma árvore em bronze que está num outro sítio das Tulherias. Mas a mim interessou-me este contexto do jardim e a proximidade de outras esculturas antropomórficas feitas em pedra ou em bronze foram, de alguma maneira, algo que eu tomei em consideração quando comecei a construir esta minha peça. Não é tanto o espaço da cidade que determinou, mas sim o espaço restrito, o espaço do jardim. Sabe que os jardins são uma coisa muito interessante porque representam, nas suas diferentes escolas e estéticas – há os jardins à francesa, os jardins ingleses, etc- representam a tentativa que vem de há milhares de anos que é de o homem dominar a natureza. E dominam a natureza de formas muito diferente: desviando cursos dos rios, fazendo barragens, plantando, queimando florestas e tal e uma das formas mais perversas de dominar a natureza é justamente fazer jardins que é uma espécie de natureza ideal.

Mas você aqui não quis dominar nada ou quis?

Não, não. Os artistas nunca dominam nada. É a arte que domina de uma forma incontornável a maneira como as pessoas se vêm e estão no mundo e a história da humanidade é determinada, em muito boa parte, pelo pensamento que provém ou advém da criação artística. E repare que não é só da criação artística plástica, é da música, da poesia… A arte tem um papel discreto mas poderosíssimo na forma como a Humanidade evolui e como as pessoas se vêem a si próprias.

As esculturas que concebeu não são discretas, pelo contrário, impõem-se no Jardim das Tulherias…

Quando se faz uma obra de arte para um espaço público, a questão da escala é importante porque há que ter em conta uma quantidade de circunstâncias com as quais não se pode negociar. Aqui, por exemplo, temos o tamanho das árvores, a extensão do jardim, o tamanho do Louvre que está aqui ao lado, digamos, há uma quantidade de segmentos que é importante não ignorar quando se desenha, quando se pensa, quando se projecta, quando se concebe uma obra de arte para um sítio. A paisagem, entre aspas, o entorno que contextualiza a obra entra em linha de conta na forma como ela é feita.

As suas obras figuram nas colecções de vários museus contemporâneos em todo o mundo. Você ja participou na documenta de Kassel em 1992 e 1997, representou Portugal na Bienal de Veneza em 2003, expôs recentemente em Marselha, em Toulon em 2015, na bienal de Lyon em 2009, em Chamarande em 2008… fica ainda assim a sensação que o seu trabalho é pouco mostrado em França… Participar nesta temporada vem corrigir um erro?

Não, não creio que venha corrigir um erro. Vem acrescentar uma linha muito importante à minha narrativa pessoal. É bom e é claramente positivo, de facto, ter uma escultura no Louvre. Portanto não creio que nem eu nem o Louvre tenhamos quaisquer intenções de corrigir erros porque não há erros, há processos. As coisas continuam.

 


Fonte:da Redação e da rfi
Reeditado para:Noticias do Stop 2022
Outras fontes • AFP, AP, TASS, EBS
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